Economia

Contas mal feitas podem dar bom resultado?

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Contas mal feitas podem dar bom resultado?

Corria o ano de 1491 e os reis espanhóis deparavam-se com um insistente navegador, de seu nome Cristóvão Colombo, que lhes garantia ser possível alcançar o desejado Oriente, navegando para ocidente, partindo de Espanha. Por esta altura, a rivalidade entre Espanha e Portugal era intensa, e os reis espanhóis estavam dispostos a quase tudo para encontrarem a sua entrada nas rotas lucrativas do comércio do Oriente. No entanto, os conselheiros de Fernando e Isabel eram totalmente contrários a que Espanha financiasse tal epopeia, argumentando que os cálculos de Cristóvão Colombo estavam errados. Desde o Egipto antigo que a circunferência da Terra estava estimada em cerca de 40 mil quilómetros, tendo esta estimativa sido confirmada posteriormente por diversas vezes. Apesar disto, Cristóvão Colombo afirmava que, com base nos seus próprios cálculos, o valor seria de 24 mil quilómetros. Era com base neste cálculo errado que o navegador sustentava ser possível chegar ao Oriente seguindo pelo ocidente, sem necessidade de contornar África, como faziam os portugueses.

Vem isto a propósito da recente apresentação, pelo Governo, do Projeto de Plano Orçamental 2016. Neste documento, o Ministério das Finanças inclui um conjunto de previsões macroeconómicas (o chamado “Cenário Macroeconómico”) que servirão de base o Orçamento do Estado para 2016. Vamos então analisar alguns números.

Segundo o Governo, após um crescimento de 0,9% em 2014, prevê-se que o PIB acelere para 1,5% em 2015 e 2,1% em 2016. O Ministério das Finanças sustenta que a procura interna continuará a ser o principal motor de crescimento, assente nomeadamente na manutenção do ritmo do consumo privado (2,6%). As exportações líquidas deverão dar um contributo negativo (-0,3 p.p.), embora menor do que em 2015. A desaceleração das exportações (de 5,9% para 4,9%) deverá ser mais do que compensada pela desaceleração das importações (de 7,6% para 5,9%), não obstante o crescimento da procura interna.

Relativamente ao Emprego, o Governo estima a continuação da diminuição da taxa de desemprego, atingindo 11,2% no final do ano (12,3% em 2015). O emprego deverá crescer 1,0%, embora desacelerando ligeiramente face aos anos anteriores (1,1% em 2015).

Parece óbvio que qualquer exercício de previsão tem os seus riscos, ainda mais num contexto de tamanha incerteza como o atual, com o preço do petróleo em mínimos, os países emergentes a enfrentarem dificuldades, e a China a “travar”. Prudência nas previsões é o que se pede.

Vejamos as seguintes considerações sobre os números do Governo: “As previsões macroeconómicas subjacentes ao Projeto de Plano Orçamental para 2016 apresentam riscos relevantes (…).”; “A presente conjuntura internacional deveria levar a maior prudência na hipótese assumida para a evolução da procura externa. Os riscos decorrentes de previsões que se revelem otimistas são especialmente significativos num contexto de forte incerteza quanto à evolução da economia mundial e de elevado endividamento da economia portuguesa.”. “O crescimento assente na procura interna, designadamente no consumo privado, corresponde a uma tendência bem documentada no passado. Embora não implausíveis estatisticamente no curto prazo, as previsões quanto ao comportamento dos preços, do investimento e do comércio externo em 2016 podem ser consideradas como pouco prudentes.”.

Estas considerações foram feitas pelo Conselho das Finanças Públicas (órgão independente, que iniciou a sua atividade em fevereiro de 2012, com a missão de proceder a uma avaliação independente sobre a consistência, cumprimento e sustentabilidade da política orçamental), e constam de um parecer emitido no passado dia 21 de janeiro.

Como é sabido, Cristóvão Colombo conseguiu mesmo convencer os reis espanhóis a financiar a sua viagem, tendo a mesma resultado inadvertidamente na descoberta da América. Apesar da imprudência da decisão tomada, baseada em cálculos incorretos, o resultado final foi altamente positivo. Será que em 2016 vamos ter algo parecido em Portugal? Cálculos imprudentes conduzirão a um “final feliz”? Cá estaremos todos para ver se a História se repete…

Até breve!

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CEO da UWU Solutions / Consultor / Docente 

blog@marcoliborio.me

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4 thoughts on “Contas mal feitas podem dar bom resultado?

  1. A tua analogia é muito interessante, gostei bastante. A informação facultada também, sintética e objectiva. Não posso deixar de acrescentar que neste caso, infelizmente, se a aventura afunda é todo um país que mais uma vez vai sofrer e ter que pagar um elevado preço. No caso do Cristóvão era a sua nau (e as que o acompanhavam) que se afundavam se a coisa corresse mal, sendo ele responsável, aqui o comandante saltará borda fora rapidamente e deixará para quem vier a seguir. Dito isto, estou a torcer para bem de todos nós que esta “aventura” dê certo.

    • Amigo Miguel, obrigado pelo teu comentário. Também desejo que tudo corra bem e que Portugal consiga ultrapassar esta fase difícil. Espero que, desta vez, os nossos líderes estejam à altura, embora tema que tal não aconteça… Um grande abraço!

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